quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

BRASIL-CUBA

Brasil, Cuba e o socialismo

www.escambray.cu 
Por Beto Almeida, de Havana

Tem sido extremamente educativo registrar, aqui em Havana, a reação do povo cubano diante da inauguração do Porto de Mariel. Expressando um elevado nível cultural, uma mirada política aprofundada sobre os fenômenos destes tempos, especialmente sobre a reunião de Cúpula da Celac que se realiza por estes dias aqui na Ilha, tendo como meta central, a redução da pobreza, os cubanos revelam, nestas análises feitas com desembaraço e naturalidade, todo o esforço de 55 anos da Revolução Cubana feita na educação e na cultura deste povo.

Mariel, uma bofetada no bloqueio 
Poderia citar muitas frases que colhi ao acaso, conversando com os mais diversos segmentos sociais, faixas etárias distintas, etc, mas, uma delas, merece ser difundida amplamente. O marinheiro aposentado Jorge Luis, que já esteve nos portos de Santos e Rio de Janeiro, que vibra com o samba carioca, foi agudo na sua avaliação sobre o significado da parceria do Brasil com Cuba para construir o Complexo Portuário de Mariel.

“Com Mariel, Brasil rompe concretamente o bloqueio imperialista contra Cuba”, disse. E adverte: “Jamais os imperialistas vão perdoar Lula e Dilma”. Ele não disse, mas, no contexto do diálogo com este marinheiro negro, atento ao noticiário de televisão, leitor diário de jornal, informado sobre o que ocorre no Brasil e no mundo, estava subentendido, por sua expressão facial, que ficava muito claro porque Dilma é alvo de espionagem dos EUA.

O tom da cobertura do oposicionismo impresso brasileiro, pré-pago, à inauguração do Porto de Mariel, não surpreende pela escassa informação que apresenta, muito menos pela abundante insinuação de que tratar-se-ia apenas de um gasto sem sentido, indefensável, indevido. Ademais, sobram os rançosos preconceitos de sempre, afirmando que o Brasil estaria financiando a “ditadura comunista”, tal como este oposicionismo chegou a mencionar que seria esta a única razão para empreender um programa como o Mais Médicos, que salva vidas e que tem ampla aprovação da sociedade brasileira.

 É necessário um jornalismo de integração
Informações objetivas sobre o significado e a transcendência do Complexo Portuário de Mariel certamente faltarão ao povo brasileiro. Primeiramente, porque o oposicionismo midiático não permitirá sua difusão, numa evidente prática de censura. E, por outro lado, nem o PT ou as forças que sustentam politicamente o governo Dilma e estas iniciativas robustas da política externa brasileira, com tangíveis repercussões sobre a economia brasileira, possuem uma mídia própria para esclarecer o significado de Mariel, ante um provável dilúvio de desinformações sobre a sociedade brasileira.

Primeiramente, deve-se informar que o financiamento feito pelo BNDES, algo em torno de um bilhão reais na primeira fase, não se trata de uma doação a Cuba. É um empréstimo, que será pago. As relações bilaterais Brasil-Cuba registram crescimento contínuo nos últimos anos.

Além disso, está condicionado à contratação de bens e serviços na economia brasileira, além de envolver cerca de 400 empresas, sendo, portanto, um dos fatores a mais que explicam porque há contínua expansão no mercado de trabalho brasileiro, com uma taxa de desemprego das mais baixas de sua história. Ao contrário do que ocorre, por exemplo, na Europa, onde aumenta o desemprego e há eliminação de direitos trabalhistas e sociais conquistados décadas atrás.

Dinamização das forças produtivas
Além disso, Mariel vai ser - por enquanto , Dilma inaugurou apenas a primeira fase - o maior porto do Caribe, com capacidade para atracar navios de calado superior a 18 metros, e também , podendo movimentar mais de 1 milhão de conteiners por ano. Terá um impacto especial para o comércio marítimo também direcionado ao Pacífico, via Canal de Panamá. Para isto, vale lembrar da importância da participação da China, crescente, na economia latino-americana, em especial com o Brasil.

Tanto o gigante asiático como empresas brasileiras, já manifestaram interesse em instalarem-se na Zona Econômica Especial a ser implantada em Mariel, onde também já foi construída uma rodovia moderna, estando em construção, uma ferrovia. De alguma maneira , Havana retoma uma posição de destaque no comércio marítimo internacional, pois já foi o maior porto da América Latina, ponto de conexão de várias rotas, tendo sido, por isso mesmo, uma cidade com mais de 70 por cento de habitantes portugueses, quando Portugal era um grande protagonista na marinha mercante internacional. Havana já teve, também, uma das maiores indústrias navais do mundo.

Cuba sempre impulsionou a integração
O tirocínio do marinheiro negro Jorge Luis é perfeito. Depois de suportar décadas de um bloqueio que impediu os cubanos a compra de uma simples aspirina no maior e mais próximo mercado do mundo, os EUA, a Revolução Cubana, tendo resistido a ventos e tempestades, sobretudo às agressões imperialistas, soube preparar-se para esta nova etapa da história, simbolizada pela existência de uma Celac que vai se consolidando, pouco a pouco. Não sem enfrentar ações desestabilizadoras, lançadas contra os países mais empenhados na integração regional latino-americana, como Venezuela, Bolívia, Equador, e, também, pelas evidentes ações hostis contra Brasil e Argentina.

Cuba investiu parte de seus modestos recursos na solidariedade internacional. Seja no envio de 400 mil homens e mulheres para derrotar o exército racista da África do Sul que havia invadido Angola, como também para promover, em vários quadrantes, com o envio de professores, métodos pedagógicos, médicos e vacinas, a eliminação do analfabetismo e o salvamento generalizado de vidas. É o caso, por exemplo, do programa Mais Médicos, não por acaso tão injustamente desprezado pela oligarquia midiática, que vocaliza os laboratórios farmacêuticos multinacionais. Como defender que salvar vidas merece desprezo?

É certo que todas as economias caribenhas e latino-americanas serão dinamizadas com a entrada em funcionamento do Porto de Mariel, gerando mais empregos, possibilitando novas opções comerciais. É emblemático que China esteja firmando um acordo estratégico de cooperação com a Celac. Para uma economia cercada de restrições, sem capacidade de investimentos, sem engenharia nacional para fazer esta obra por conta própria, o Porto de Mariel, é um imenso descortinar de possibilidades para Cuba.

Os gigantescos navios chineses, de uma China que consolida sua posição como a segunda potência comercial mundial, não podiam mais aportar no velho Porto de Havana, o que resultava numa limitação operacional e logística, com impactos econômicos negativos de grande monta. O Porto de Havana será readaptado para o turismo e a economia cubana, no seu conjunto, recebe, com Mariel um enorme impulso para a dinamização de suas forças produtivas. A atendente do hotel onde estou instalado me confessava hoje o interesse de ir trabalhar em Mariel, porque, segundo disse, o futuro está por ali e são empregos mais promissores. 

Mariel e seus impactos internacionais
Realmente, para um economia que perdeu a parceria que tinha com a União Soviética, que resistiu durante o período especial com as adaptações inevitáveis para salvar o essencial das conquistas da Revolução, o que Mariel significará é de extraordinária relevância. E é exatamente na dinamização das forças produtivas da Revolução Cubana que se localizam as chaves para muitas portas que podem ser abertas para uma maior dedicação de meios , recursos e iniciativas visando a integração latino-americana. E, neste quebra-cabeças, a política estratégica implantada por Lula, continuada por Dilma, é, inequivocamente, muito decisiva. Que outro país poderia fazer um financiamento deste porte para a construção de Mariel?

Por último, pode ser muito útil uma reflexão sobre os diversos pensadores, formuladores e também executores de políticas de integração. Desde Marti, aquele analisou a importância da “nossa Grécia”, numa referência ao significado da civilização Inca, mas que também formulou o conceito de Nuestra América, até chegando ao pensamento de Getúlio Vargas, criador do BNDES, o banco estatal de fomento que está financiando a construção do Porto de Mariel, uma estupenda ferramenta integradora.

Tudo converge para a abertura de uma nova avenida para dar trânsito à integração. Seja pela sabedoria dos povos da região que estão sabendo apoiar, com o seu voto, os governos que mais impulsionam estas políticas, seja pelos avanços concretos que estas políticas integradoras têm registrados, apesar da insistência nada profissional do jornalismo de desintegração em reduzir tudo a zero.

Futuro socialista
A força e a necessidade histórica das ideias se vêm comprovadas nesta inauguração da primeira etapa do Porto de Mariel, em plena reunião da Celac, sem a presença de Estados Unidos e Canadá, patrocinadores históricos da desintegração entre os povos. A simbologia da justeza histórica do pensamento martiniano, nos permite, agora, afirmar, também, que José Marti é um dos autores intelectuais de Mariel. E, retomando o otimismo realista do marinheiro Jorge Luis, constatamos que a dinamização das forças produtivas da Revolução Cubana que a parceria entre Cuba e Brasil possibilita, foi estampada na frase final do discurso do presidente cubano, General Raul Castro:

“Mariel e a poderosa infraestrutura que o acompanha são uma mostra concreta do otimismo e da confiança com que os cubamos olham o futuro socialista e próspero da Pátria”. O marinheiro negro captou o significado essencial destes dias. Não por acaso, a Marcha das Tochas, que celebra com chamas que não se apagam, as ideias de Marti, em seu aniversário, ontem - com mais de 500 mil manifestantes, maioria esmagadora de jovens - teve, na primeira fila, além de Raul, os presidentes Evo Morales, Nicolás Maduro, Pepe Mujica, Daniel Ortega. As ideias de Marti, materializadas nestes avanços produtivos e integradores, como Mariel, vão iluminando o futuro socialista de Cuba e, com isto, da integração latino-americana.

* Beto Almeida é membro do Diretório da Telesur

terça-feira, 28 de janeiro de 2014

VAI TER COPA !


Vai ter Copa: argumentos para enfrentar quem torce contra o Brasil

Como a desinformação alimenta o festival de besteiras ditas contra a Copa do Mundo de Futebol no Brasil.

Profetas do pânico: os gupos que patrocinam a campanha anticopa

Antonio Lassance  


Existe uma campanha orquestrada contra a Copa do Mundo no Brasil. A torcida para que as coisas deem errado é pequena, mas é barulhenta e até agora tem sido muito bem sucedida em queimar o filme do evento.

Tiveram, para isso, uma mãozinha de alguns governos, como o do estado do Paraná e da prefeitura de Curitiba, que deram o pior de todos exemplos ao abandonarem seus compromissos com as obras da Arena da Baixada, praticamente comprometida como sede.

A arrogância e o elitismo dos cartolas da Fifa também ajudaram. Aliás, a velha palavra “cartola” permanece a mais perfeita designação da arrogância e do elitismo de muitos dirigentes de futebol do mundo inteiro.

Mas a campanha anticopa não seria nada sem o bombardeio de informação podre patrocinado pelos profetas do pânico.

O objetivo desses falsos profetas não é prever nada, mas incendiar a opinião pública contra tudo e contra todos, inclusive contra o bom senso.

Afinal, nada melhor do que o pânico para se assassinar o bom senso.

Como conseguiram azedar o clima da Copa do Mundo no Brasil

O grande problema é quando os profetas do pânico levam consigo muita gente que não é nem virulenta, nem violenta, mas que acaba entrando no clima de replicar desinformações, disseminar raiva e ódio e incutir, em si mesmas, a descrença sobre a capacidade do Brasil de dar conta do recado.

Isso azedou o clima. Pela primeira vez em todas as copas, a principal preocupação do brasileiro não é se a nossa seleção irá ganhar ou perder a competição.

A campanha anticopa foi tão forte e, reconheçamos, tão eficiente que provocou algo estranho. Um clima esquisito se alastrou e, justo quando a Copa é no Brasil, até agora não apareceu aquela sensação que, por aqui, sempre foi equivalente à do Carnaval.

Se depender desses Panicopas (os profetas do pânico na Copa), essa será a mais triste de todas as copas.

“Hello!”: já fizemos uma copa antes

Até hoje, os países que recebem uma Copa tornam-se, por um ano, os maiores entusiastas do evento. Foi assim, inclusive, no Brasil, em 1950. Sediamos o mundial com muito menos condições do que temos agora.

Aquela Copa nos deixou três grandes legados. O primeiro foi o Maracanã, o maior estádio do mundo – que só ficou pronto faltando poucos dias para o início dos jogos.

O segundo, graças à derrota para o Uruguai (“El Maracanazo”), foi o eterno medo que muitos brasileiros têm de que as coisas saiam errado no final e de o Brasil dar vexame diante do mundo - o que Nélson Rodrigues apelidou de “complexo de vira-latas”,  a ideia de que o brasileiro nasceu para perder, para errar, para sofrer.

O terceiro legado, inestimável, foi a associação cada vez mais profunda entre o futebol e a imagem do país. O futebol continua sendo o principal cartão de visitas do Brasil – imbatível nesse aspecto.

O cartunista Henfil, quando foi à China, em 1977, foi recebido com sorrisos no rosto e com a única palavra que os chineses sabiam do Português: “Pelé” (está no livro “Henfil na China”, de 1978).

O valor dessa imagem para o Brasil, se for calculada em campanhas publicitárias para se gerar o mesmo efeito, vale uma centena de Maracanãs. 

Desinformação #1: o dinheiro da Copa vai ser gasto em estádios e em jogos de futebol, e isso não é importante

O pior sobre a Copa é a desinformação. É da desinformação que se alimenta o festival de besteiras que são ditas contra a Copa.

Não conheço uma única pessoa que fale dos gastos da Copa e saiba dizer quanto isso custará para o Brasil. Ou, pelo menos, quanto custarão só os estádios. Ou que tenha visto uma planilha de gastos da copa.

A “Copa” vai consumir quase 26 bilhões de reais.

A construção de estádios (8 bi) é cerca de 30% desse valor.

Cerca de 70% dos gastos da Copa não são em estádios, mas em infraestrutura, serviços e formação de mão de obra.

Os gastos com mobilidade urbana praticamente empatam com o dos estádios.

O gastos em aeroportos (6,7 bi), somados ao que será investido pela iniciativa privada (2,8 bi até 2014) é maior que o gasto com estádios.

O ministério que teve o maior crescimento do volume de recursos, de 2012 para 2013, não foi o dos Esportes (que cuida da Copa), mas sim a Secretaria da Aviação Civil (que cuida de aeroportos).

Quase 2 bi serão gastos em segurança pública, formação de mão de obra e outros serviços.

Ou seja, o maior gasto da Copa não é em estádios. Quem acha o contrário está desinformado e, provavelmente, desinformando outras pessoas.

Desinformação #2: se deu mais atenção à Copa do que a questões mais importantes

Os atrasos nas obras pelo menos serviram para mostrar que a organização do evento não está isenta de problemas que afetam também outras áreas. De todo modo, não dá para se dizer que a organização da Copa teve mais colher de chá que outras áreas. 

Certamente, os recursos a serem gastos em estádios seriam úteis a outras áreas. Mas se os problemas do Brasil pudessem ser resolvidos com 8 bi, já teriam sido.

Em 2013, os recursos destinados à educação e à saúde cresceram. Em 2014, vão crescer de novo. 

Portanto, o Brasil não irá gastar menos com saúde e educação por causa da Copa. Ao contrário, vai gastar mais. Não por causa da Copa, mas independentemente dela.

No que se refere à segurança pública, também haverá mais recursos para a área. Aqui, uma das razões é, sim, a Copa.

Dados como esses estão disponíveis na proposta orçamentária enviada pelo Executivo e aprovada pelo Congresso (nas referências ao final está indicado onde encontrar mais detalhes).  

Se alguém quiser ajudar de verdade a melhorar a saúde e a educação do país, ao invés de protestar contra a Copa, o alvo certo é lutar pela aprovação do Plano Nacional de Educação, pelo cumprimento do piso salarial nacional dos professores, pela fixação de percentuais mais elevados e progressivos de financiamento público para a saúde e pela regulação mais firme sobre os planos de saúde.

Se quiserem lutar contra a corrupção, sugiro protestos em frente às instâncias do Poder Judiciário, que andam deixando prescrever crimes sem o devido julgamento, e rolezinhos diante das sedes do Ministério Público em alguns estados, que andam com as gavetas cheias de processos, sem dar a eles qualquer andamento.

Marchar em frente aos estádios, quebrar orelhões públicos e pichar veículos em concessionárias não tem nada a ver com lutar pela saúde e pela educação.

Os estádios, que foram malhados como Judas e tratados como ícones do desperdício, geraram, até a Copa das Confederações, 24,5 mil empregos diretos. Alto lá quando alguém falar que isso não é importante.

Será que o raciocínio contra os estádios vale para a também para a Praça da Apoteose e para todos os monumentos de Niemeyer? Vale para a estátua do Cristo Redentor? Vale para as igrejas de Ouro Preto e Mariana? 

Havia coisas mais importantes a serem feitas no Brasil, antes desses monumentos extraordinários. Mas o que não foi feito de importante deixou de ser feito porque construíram o bondinho do Pão-de-Açúcar? 

Até mesmo para o futebol, o jogo e o estádio são, para dizer a verdade, um detalhe menos importante. No fundo, estádios e jogos são apenas formas para se juntar as pessoas. Isso sim é muito importante. Mais do que alguns imaginam. 

Desinformação #3: O Brasil não está preparado para sediar o mundial e vai passar vexame

Se o Brasil deu conta da Copa do Mundo em 1950, por que não daria conta agora? 

Se realizou a Copa das Confederações no ano passado, por que não daria conta da Copa do Mundo? 

Se recebeu muito mais gente na Jornada Mundial da Juventude, em uma só cidade, porque teria dificuldades para receber um evento com menos turistas, e espalhados em mais de uma cidade?

O Brasil não vai dar vexame, quando o assunto for segurança, nem diante da Alemanha, que se viu rendida quando dos atentados terroristas em Munique, nos Jogos Olímpicos de Verão de 1972; nem diante dos Estados Unidos, que sofreu atentados na Maratona Internacional de Boston, no ano passado.

O Brasil não vai dar vexame diante da Itália, quando o assunto for a maneira como tratamos estrangeiros, sejam eles europeus, americanos ou africanos.

O Brasil não vai dar vexame diante da Inglaterra e da França, quando o assunto for racismo no futebol. Ninguém vai jogar bananas para nenhum jogador, a não ser que haja um Panicopa no meio da torcida. 

O Brasil não vai dar vexame diante da Rússia, quando o assunto for respeito à diversidade e combate à homofobia.

O Brasil não vai dar vexame diante de ninguém quando o assunto for manifestações populares, desde que os governadores de cada estado convençam seus comandantes da PM a usarem a inteligência antes do spray de pimenta e a evitar a farra das balas de borracha.

Podem ocorrer problemas? Podem. Certamente ocorrerão. Eles ocorrem todos os dias. Por que na Copa seria diferente? A grande questão não é se haverá problemas. É de que forma nós, brasileiros, iremos lidar com tais problemas.

Desinformação #4: os turistas estrangeiros estão com medo de vir ao Brasil 

De tanto medo do Brasil, o turismo para o Brasil cresceu 5,6% em 2013, acima da média mundial. Foi um recorde histórico (a última maior marca havia sido em 2005).

Recebemos mais de 6 milhões de estrangeiros. Em 2014, só a Copa deve trazer meio milhão de pessoas. 

De quebra, o Brasil ainda foi colocado em primeiro lugar entre os melhores países para se visitar em 2014, conforme o prestigiado guia turístico Lonely Planet (“Best in Travel 2014”, citado nas referências ao final).

Adivinhe qual uma das principais razões para a sugestão? Pois é, a Copa.


Desinformação #5: a Copa é uma forma de enganar o povo e desviá-lo de seus reais problemas

O Brasil tem de problemas que não foram causados e nem serão resolvidos pela Copa.

O Brasil tem futebol sem precisar, para isso, fazer uma copa do mundo. E a maioria assiste aos jogos da seleção sem ir a estádios. 

Quem quiser torcer contra o Brasil que torça. Há quem não goste de futebol, é um direito a ser respeitado. Mas daí querer dar ares de “visão crítica” é piada.

Desinformação #6: muitas coisas não ficarão prontas antes da Copa, o que é um grave problema

É verdade, muitas coisas não ficarão prontas antes da Copa, mas isso não é um grave problema. Tem até um nome: chama-se “legado”.

Mas, além do legado em infraestrutura para o país, a Copa provocou um outro, imaterial, mas que pode fazer uma boa diferença. 

Trata-se da medida provisória enviada por Dilma e aprovada pelo Congresso (entrará em vigor em abril deste ano), que limita o tempo de mandato de dirigentes esportivos.

A lei ainda obrigará as entidades (não apenas de futebol) a fazer o que nunca fizeram: prestar contas, em meios eletrônicos, sobre dados econômicos e financeiros, contratos, patrocínios, direitos de imagem e outros aspectos de gestão. Os atletas também terão direito a voto e participação na direção. Seria bom se o aclamado Barcelona, de Neymar, fizesse o mesmo.

Estresse de 2013 virou o jogo contra a Copa

Foi o estresse de 2013 que virou o jogo contra a Copa. Principalmente quando aos protestos se misturaram os críticos mascarados e os descarados.

Os mascarados acompanharam os protestos de perto e neles pegaram carona, quebrando e botando fogo. Os descarados ficaram bem de longe, noticiando o que não viam e nem ouviam; dando cartaz ao que não tinha cartaz; fingindo dublar a “voz das ruas”, enquanto as ruas hostilizavam as emissoras, os jornalões, as revistinhas e até as coitadas das bancas.

O fato é que um sentimento estranho tomou conta dos brasileiros. Diferentemente de outras copas, o que mais as pessoas querem hoje saber não é a data dos jogos, nem os grupos, nem a escalação dos times de cada seleção.  

A maioria quer saber se o país irá funcionar bem e se terá paz durante a competição. Estranho. 

É quase um termômetro, ou um teste do grau de envenenamento a que uma pessoa está acometida. Pergunte a alguém sobre a Copa e ouça se ela fala dos jogos ou de algo que tenha a ver com medo. Assim se descobre se ela está empolgada ou se sentou em uma flecha envenenada deixada por um profeta do apocalipse.

Todo mundo em pânico: esse filme de comédia a gente já viu

Funciona assim: os profetas do pânico rogam uma praga e marcam a data para a tragédia acontecer. E esperam para ver o que acontece. Se algo “previsto” não acontece, não tem problema. A intenção era só disseminar o pânico e o baixo astral mesmo.

O que diziam os profetas do pânico sobre o Brasil em 2013?  Entre outras coisas:

Que estávamos à beira de um sério apagão elétrico.

Que o Brasil não conseguiria cumprir sua meta de inflação e nem de superávit primário.

Que o preço dos alimentos estava fora de controle.

Que não se conseguiria aprontar todos os estádios para a Copa das Confederações.

O apagão não veio e as termelétricas foram desligadas antes do previsto. A inflação ficou dentro da meta. A inflação de alimentos retrocedeu. Todos os estádios previstos para a Copa das Confederações foram entregues.

Essas foram as profecias de 2013. Todas furadas.

Cada ano tem suas previsões malditas mais badaladas. Em 2007 e 2008, a mesma turma do pânico dizia que o Brasil estava tendo uma grande epidemia de febre amarela. Acabou morrendo mais gente de overdose de vacina do que de febre amarela, graças aos profetas do pânico.

Em 2009 e 2010, os agourentos diziam que o Brasil não estava preparado para enfrentar a gripe aviária e nem a gripe “suína”, o H1N1. Segundo esses especialistas em catástrofes, os brasileiros não tinham competência nem estrutura para lidar com um problema daquele tamanho. Soa parecido com o discurso anticopa, não?

O cataclismo do H1N1 seria gravíssimo. Os videntes falavam aos quatro cantos que não se poderia pegar ônibus, metrô ou trem, tal o contágio. Não se poderia ir à escola, ao trabalho, ao supermercado. Resultado? Não houve epidemia de coisa alguma.

Mas os profetas do pânico não se dão por vencidos. Eles são insistentes (e chatos também). Quando uma de suas profecias furadas não acontece, eles simplesmente adiam a data do juízo final, ou trocam de praga.

Agora, atenção todos, o próximo fim do mundo é a Copa. “Imagina na Copa” é o slogan. E há muita gente boa que não só reproduz tal slogan como perde seu tempo e sua paciência acreditando nisso, pela enésima vez. 

Para enfrentar o pessoal que é ruim da cabeça ou doente do pé

O pânico é a bomba criada pelos covardes e pulhas para abater os incautos, os ingênuos e os desinformados.

Só existe um antídoto para se enfrentar os profetas do pânico. É combater a desinformação com dados, argumentos e, sobretudo, bom senso, a principal vítima da campanha contra a Copa.

Informação é para ser usada. É para se fazer o enfrentamento do debate. Na escola, no trabalho, na família, na mesa de bar.

É preciso que cada um seja mais veemente, mais incisivo e mais altivo que os profetas do pânico. Eles gostam de falar grosso? Vamos ver como se comportam se forem jogados contra a parede, desmascarados por uma informação que desmonta sua desinformação.

As pessoas precisam tomar consciência de que deixar uma informação errada e uma opinião maldosa se disseminar é como jogar lixo na rua. 

Deixar envenenar o ambiente não é um bom caminho para melhorar o país.

A essa altura do campeonato, faltando poucos meses para a abertura do evento, já não se trata mais de Fifa. É do Brasil que estamos falando.

É claro que as informações deste texto só fazem sentido para aqueles para quem as palavras “Brasil” e “brasileiros” significam alguma coisa.

Há quem por aqui nasceu, mas não nutre qualquer sentimento nacional, qualquer brasilidade; sequer acreditam que isso existe. Paciência. São os que pensam diferente que têm que mostrar que isso existe sim.

Ter orgulho do país e torcer para que as coisas deem certo não deve ser confundido com compactuar com as mazelas que persistem e precisam ser superadas. É simplesmente tentar colocar cada coisa em seu lugar.

Uma das maneiras de se colocar as coisas no lugar é desmascarar oportunistas que querem usar da pregação anticopa para atingir objetivos que nunca foram o de melhorar o país.

O pior dessa campanha fúnebre não é a tentativa de se desmoralizar governos, mas a tentativa de desmoralizar o Brasil.

É preciso enfrentar, confrontar e vencer esse debate. É preciso mostrar que esse pessoal que é profeta do pânico é ruim da cabeça ou doente do pé.

(*) Antonio Lassance é doutor em Ciência Política e torcedor da Seleção Brasileira de Futebol desde sempre.

TERRORISTAS

Atos terroristas numa sociedade democrática

ABAIXO AS MÁSCARAS 

Querem transporte coletivo de qualidade, mas depredam pontos de ônibus e colocam fogo nos coletivos. São contra a especulação financeira internacional e depredam agências do Banco do Brasil e da Caixa Econômica. Reclamam do custo das ligações telefônicas, mas arrebentam com os orelhões. Pedem mais investimentos em cultura e educação e invadem teatros e shows. São contra os grandes magazines, mas saqueiam pequenas lojas do comércio. Dizem defender os direitos do cidadão humilde, mas colocam fogo em carros populares com a família dentro. São contra a Copa do Mundo, mas não fizeram nada para evitar que ela viesse para o Brasil. Para mim, esse quebra-quebra todo é coisa de fascista, neonazista ou de pessoas a mando de um esquema clandestino para levar à insegurança institucional. São atos terroristas numa sociedade democrática onde as liberdades individuais são garantidas pela Constituição. Como diria Caetano Veloso, alguma coisa está fora da ordem.

Trinta anos após o início da campanha das Diretas Já, temos bons motivos para nos preocupar com o futuro da nossa democracia. Os governos do PT e do PSDB têm responsabilidade de preservar o maior legado da geração que foi às ruas pela redemocratização do país. Foi ela o embrião dos dois partidos. Não quero ser paranoico, mas devemos saber quem são esses encapuzados que se infiltram em movimentos de protesto para gerar pânico e violência descabida.

Tenho uma amiga no Facebook que estuda o movimento Black Blocs e que acompanhou o “protesto” de sábado em São Paulo. Segundo ela, pela primeira vez no grupo havia gente de 14 e 15 anos que ficou apavorada com a violência nas ruas e se retirou das manifestações. Hoje a Folha publica o perfil de quem foi preso pela polícia. Dos 119 identificados, 62 têm entre 20 e 29 anos e 14 são menores de idade. Entre os detidos, uma menina de 14 anos e um senhor de 59 que é funcionário público. E ficou nisso. Nada além. Apenas quatro dos que participaram de atos de vandalismo foram detidos. Isso mostra que os mais violentos sabem quando e como desaparecer da cena do crime.

É urgente que o setor de inteligência das polícias federal, estadual e municipal identifiquem os vândalos para saber com exatidão quem são e se estão agindo a mando de grupos neonazistas ou de paramilitares. A nossa democracia precisa ser defendida imediatamente antes que seja tarde demais.

A realização da Copa no Brasil teve o apoio de quase todos os partidos e dos governos estaduais e municipais. A escolha do Brasil como sede do mundial foi comemorada pela maioria da população brasileira que ama o futebol. Realmente as exigências da Fifa foram exageradas, e algumas obras de governos estaduais excederam e muito os gastos previstos.

Aqui em São Paulo, o estádio da Copa é privado. O mesmo ocorre em Curitiba e no Rio Grande do Sul. Devemos cobrar explicações dos governos de Minas, Rio de Janeiro, Amazonas, Rio Grande do Norte, Pernambuco, Distrito Federal, Ceará e Bahia. Cada um que se explique. Em ano eleitoral é bom mesmo saber quem administrou mal os recursos públicos.  Mas depois de todo o caminho percorrido, boicotar a Copa é de uma burrice sem tamanho. O melhor a fazer é aproveitar o evento para retirar dele parte dos gastos que tivemos.

A sociedade civil e os movimentos organizados devem continuar indo às ruas para cobrar de seus governantes ações de interesse público: saúde, educação, segurança, moradia, reforma agrária e transporte público de qualidade. Mas de cara limpa, sem máscaras. Pra mim, quem esconde o rosto numa democracia não tem boas intenções. Mesmo nos movimentos revolucionários em períodos de totalitarismo as pessoas tinham convicção do que queriam e não tinham motivos para esconder seus rostos.  

segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

ASSALTO DOS BANQUEIROS


 

Vesúvio
    

O Vesúvio rentista  


Há um vulcão fumegando nas entranhas da economia do país. Na última quarta, ele cuspiu pela 7ª vez na cabeça da nação. Toca o baile! aconselham especialistas 

Por Saul Leblon   


Há um vulcão fumegando nas entranhas da economia brasileira.
 
Avisos de lava  em ebulição são  emitidos aqui e ali desde abril passado.
 
Na última 4ª feira, ele cuspiu pela sétima vez na cabeça da Nação.
 
A nova elevação de  0,5 ponto  na taxa de juro reafirma  um  desarranjo  em  profundezas intestinas. 

Vozes  tranquilizadoras  adiantam que uma 8ª, quem sabe  9ª, irrupção do Vesúvio rentista é inevitável –benéfica, de fato.
 
O que se passa de fato no interior da cratera  que ora urra, ora faísca e ameaça explodir tudo, é de qualquer forma sonegado à população.
 
Explicações sumárias, supostamente técnicas, ofuscam mais do que esclarecem.
 
Os juros sobem porque  é preciso conter a inflação, explica o coral que convida para o grande baile da restauração ortodoxa.
 
Mas ao subir não  inibiriam eles  o investimento produtivo que se persegue como crucial?
 
E não atrairiam fluxos especulativos de capitais, que valorizam o Real e barateiam as importações -com efeitos dissolventes na estrutura industrial, além de inibir as exportações?
 
Ademais de reduzir o nível de atividade, não penalizariam  a relação dívida/PIB estreitando a margem de manobra fiscal do governo - antessala de cortes ou protelações de investimentos públicos  inadiáveis? 
 
Desse nó nas tripas o distinto público toma conhecimento apenas pelas irrupções intermitentes.
 
Copiosas considerações de vulgarizadores asseveram a pertinência da purga incandescente. O Vesúvio, antes de ser ameaça, é benção.

Toca o baile! - aconselham  especialistas em convencer nações inteiras  a dançar  no ritmo das lavas fumegante, com resultados que não deixam Pompéia sozinha no museu das catástrofes.
 
O  nonsense  aparente  não é aleatório – faz parte da crise.
 
Entorpecer a agenda do país  é um recurso constitutivo da luta pela repartição da riqueza, que só terá  desenlace progressista se a sociedade conquistar  o discernimento  histórico do que está em jogo nesse baile de máscaras.
 
Distinguir a natureza dos interesses em confronto no salão, ademais das escolhas que eles encerram - e as suas implicações, não é café pequeno.
 
Requer, por exemplo, libertar-se da hipnótica orquestração comandada a partir do Jornal Nacional.
 
E adquirir imunidade aos esporões liberados pelos vulgarizadores, que alardeiam os interesses dos endinheirados como se fossem os de toda a nação.
 
Interditar o debate político da encruzilhada brasileira  é uma forma de circunscrever as opções  do país  aos estritos limites da boca do vulcão rentista.
 
As eleições presidenciais de 2014 se oferecem como a oportunidade concreta de ir além das lamúrias e da rendição.
 
Vence-las, sem dúvida é o imperativo.
 
O que se deve perguntar  é como essa vitória deve ser construída para que não seja apenas inercial, mas erga pontes ao passo seguinte da luta pela construção da democracia social brasileira.
 
A barragem de votos pode alterar as bases de um diálogo do qual a sociedade hoje sai invariavelmente chamuscada?
 
Quando o Vesúvio  expele sua lava incandescente é como se dissesse não: ‘O Estado pode flertar com o pleno emprego, mas o estoque da riqueza financeira não deve ser depreciado; e a fatia que ele detém no  fluxo da renda é intocável’.
 
Ou seja, ‘mãos ao alto, isso é um assalto: passe para cá os 3% do PIB  para pagar os juros da dívida pública e garanta uma Selic com ganho real acima da inflação que nada lhe acontecerá’.
 
É tautológico dizer que o ‘governo petista  aceita’  as condições impostas  pelo mercado.
 
O governo se mexe na pinguela estreita que a atual correlação de forças reserva  à mobilidade social brasileira.
 
Correlações de forças, a exemplo das vantagens comparativas na esfera econômica, são uma construção histórica de cada povo e de cada época, não uma fatalidade da natureza.
 
Mas  existem. E tem peso objetivo não apenas no plano interno.
 
Um governo que entre em choque com a tríade rentista (FMI, agencias de risco, grandes bancos) simplesmente não encontra  um guichê internacional para se abrigar dos caças bombardeio  e assegurar um fluxo alternativo  da ordem de dezenas de bilhões de dólares .
 
A inexistência desse contraponto  diz muito do aparente paradoxo entre a anemia eleitoral do conservadorismo  nativo e a sua força de sabotagem vocalizada pela mídia. 
 
Doze  anos de governos progressistas elevaram a participação do salário no PIB para algo em torno de 51% no Brasil ( o dado disponível do IBGE é de 2009; estima-se que tenha se mantido assim até 2012).
 
No ciclo tucano (1995/2003) essa fatia oscilou entre 49% e 46%.
 
Estamos falando, portanto, de uma reversão na luta pela riqueza, que até 2003 premiava invariavelmente as rendas do capital.
 
O que o vulcão rentista passou a urrar, e cada vez mais alto, é que essa espiral  bateu no teto.
 
‘No passara’, avisa.
 
O interdito afeta todo o metabolismo econômico  e contribui significativamente para agravar os impasses  em curso.
 
A saber: descasamento entre demanda e infraestrutura, desequilíbrio cambial, desindustrialização dissolvente  e déficit preocupante  em contas correntes.
 
Não é uma questão de ‘inconsistência do modelo petista’, como alardeiam os zeladores do dinheiro grosso alocados nas editorias de economia.
 
É uma questão de conflito de interesses.
 
A macroeconomia não opera em uma  dimensões celestial onde vigem os mercados autorreguláveis, os agentes racionais e seus querubins  midiáticos.
 
O chão da macroeconomia é a correlação de forças e os sinais são de que ela mudou o patamar de sua tensão no país.
 
Elevar o discernimento social sobre essa encruzilhada e se preparar para superá-la, erguendo linhas de passagem entre as eleições de outubro e o futuro, é a opção concreta que se coloca à frente progressista brasileira.
 
Lamúrias radicais diante de um vulcão não logram vantagem nem no quesito decibéis.
 
Mas tampouco aquiescer aos seus ditames garantirá a indulgência das lavas, como parece crer um certo economicismo  que aconselha ir às urnas vestido de estátua de cinzas.
 
Fonte: Carta MaiorFonte: Carta Maior

quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

IMPERIALISMO AMERICANO-AMEAÇA!


EUA são vistos como a maior ameaça no mundo, diz pesquisa


De acordo com uma pesquisa mundial publicada no final de 2013, com 66 mil pessoas em 68 países, conduzida pela Worldwide Independent Network of Market Research (WINMR) e Gallup International, a população mundial enxerga os EUA como a mais significante ameaça no planeta. A análise sobre a pesquisa foi publicada no portal de matérias sobre a resistência contra o imperialismo, Znet, por Paul Street.


US Army / Divulgação
Exército dos EUA
Embora se considerem o ator "excepcional" na política internacional, defensor da liberdade e da justiça no mundo, os Estados Unidos são cada vez mais percebidos como a maior ameaça à paz no planeta.
De acordo com Street, a visão mundial quanto ao status dos Estados Unidos como, de longe, a maior ameaça para a paz (24% dos entrevistados qualificaram o país assim, enquanto o segundo lugar, Paquistão, ficou com 8%), "deveria ser tudo, menos surpreendente, para qualquer observador sério para com a politica externa norte-americana e o cenário internacional". 

Os EUA representam quase metade de todo o gasto militar no mundo, mantêm mais de mil bases militares em mais de 100 nações “soberanas” por todos os continentes. A administração Obama autoriza a ação das Operações Especiais em 75 a 100 países (a administração Bush contava com 60 em seu final) e conduz regulares ataques letais com drones contra alvos qualificados como terroristas (e um número muito maior de civis inocentes) no Oriente Médio, Sudeste Asiático e África, explica Street.

"Mantêm também um programa massivo de vigilância global dedicado a eliminar, de fato, a privacidade na Terra – um programa que espionou até mesmo os telefones pessoais de estadistas europeus, incluindo Angela Merkel, na Alemanha." 

Como o mais famoso jornal alemão, Der Spiegel, escreveu em 1997: “Nunca antes na história moderna um pais dominou totalmente o planeta como os EUA o faz hoje, a América é agora o Schwarzenegger da política internacional: exibindo os músculos, intrusivo e intimidante, os norte-americanos, na ausência de limites impostos por qualquer um, agem como se tivessem um cheque em branco em seu ‘McMundo’”.

Sem pedido de desculpas


"Esse Schwarzenegger decidiu fazer as coisas um pouco sozinho no atual milênio. Os EUA, desde o 11 de Setembro, mataram, marcaram e desalojaram milhões ao redor do mundo muçulmano como parte de sua Guerra ao (de) Terror," diz Street. 

"A violência é sempre conduzida em nome da paz, liberdade, democracia e segurança. Um incidente ilustrativo na guerra norte-americana ao/de terror ocorreu na primeira semana de maio de 2009. Foi quando um bombardeio norte-americano matou mais de 140 civis em Bola Boluk, um vilarejo na província de Farah, no oeste do Afeganistão." 

Noventa e três dos locais mortos, destroçados pelos explosivos norte-americanos, eram crianças. Apenas 22 eram homens de 18 anos ou mais velhos. Como o New York Times reportou:

“Em uma ligação telefônica colocada no viva-voz na quarta-feira para o parlamento afegão, o governador da província de Farah, Rohul Amin, disse que cerca de 130 civis morreram, segundo o legislador, Mohammad Naim Farahi, ‘o governador disse que os locais trouxeram dois tratores cheios de pedaços de corpos humanos para seu escritório, a fim de comprovar as mortes que ocorreram…todos estavam chorando, olhando para a cena chocante’. O sr. Farahi disse que conversou com alguém que conhecia pessoalmente, e tal pessoa havia contado 113 corpos sendo enterrados, incluindo muitas mulheres e crianças.”

"A resposta inicial do Pentágono do Obama para esse incidente horrível – um entre muitos outros ataques aéreos maciços que mataram civis no Afeganistão e Paquistão desde 2011 – foi jogar a culpa das mortes às 'granadas do Talibã'," ironiza o autor.

A então secretária de Estado, Hillary Clinton, disse “lamentar” a perda de vidas humanas, mas a administração se recusava a fazer um pedido de desculpas ou reconhecer a responsabilidade dos EUA. 

"Em contraste, Obama havia acabado de oferecer um pedido completo de desculpas e demitir um funcionário da Casa Branca por assustar nova-iorquinos por conta de uma sessão de fotos do Força Aérea Um (o avião presidencial norte-americano) voando baixo sobre Manhathan o que lembrou as pessoas do 11 de Setembro."

E Street continua: "A disparidade foi extraordinária: assustar nova-iorquinos levou o presidente Obama a um pedido de desculpas e à demissão de um funcionário da Casa Branca, enquanto matar mais de 100 civis afegãos não requeria o mesmo pedido." 

Ninguém foi demitido e o Pentágono teve a permissão de seguir com as afirmações absurdas de como os civis morreram – histórias levadas a sério pela mídia, ressalta o autor. Os EUA, subsequentemente, conduziram uma duvidosa “investigação” do massacre em Bola Boluk que reduziu a contagem de corpos e culpou o Talibã por colocar civis no caminho das bombas norte-americanas.

Filhos e filhas

Outro exemplo do compromisso dos EUA com a paz e a segurança, citado por Street, é Fallujah, no Iraque. Em um discurso sobre política externa na véspera do anúncio de sua candidatura à Presidência, Barack Obama disse que “o povo estadunidense tem sido extraordinariamente determinado. Eles viram suas filhas e filhos morrerem e se ferirem nas ruas de Fallujah”.

"Essa seleção do lugar foi espantosa: Fallujah foi o local da maior atrocidade de guerra dos EUA – os crimes incluíram o assassinato indiscriminado de milhares de civis, ataques contra ambulâncias e hospitais e praticamente a completa destruição de uma cidade inteira – pelos militares norte-americanos, em abril e novembro de 2004. A cidade foi designada para destruição como um exemplo do incrível estado de terror prometido contra aqueles que ousarem resistir ao poder dos EUA." 

O uso de material radioativo nos ataques dos EUA em Fallujah ajudou a criar uma epidêmica mortalidade infantil, defeitos de nascimento, leucemia e câncer, ressaltou Street.

"A cidade de Fallujah foi apenas um episódio especialmente ilustrativo de um vasto arco criminal de uma invasão que matou prematuramente pelo menos um milhão de civis iraquianos e deixou o país como 'uma zona de desastre em uma escala catastrófica, dificilmente comparável na memória recente'."

“Então jogue-os em Guantânamo”

Lawrence Wilkerson é um ex-combatente que já serviu como chefe de gabinete do então secretário de Estado Colin Powell. Conversando com o jornalista investigativo Jeremy Scahill, citado por Street, ele descreveu uma típica operação das forças especiais durante a ocupação do Iraque: 

"Você entra lá e colhe algumas informações e você diz: Oh, isso é realmente uma boa informação para ser usada como ataque. Aqui está a Operação Trovão Azul. Vá cumpri-la. Então eles vão e matam 27, 30, 40 pessoas, que seja, e capturam sete ou oito. Depois você descobre que a informação era ruim e você matou um bando de gente inocente e que também você tem um monte de inocentes presos em suas mãos, então jogue-os em Guantânamo. Ninguém nunca saberá a respeito e então você prossegue para a próxima operação." 

"Realmente, um cheque em branco", diz Street.

Em 1991, relembra, na primeira vez que os EUA estiveram no Iraque, as forças norte-americanas massacram dezenas de milhares de soldados iraquianos que já haviam se rendido e estavam saindo do Iraque, entre 26 e 27 de fevereiro daquele ano, no que ficou conhecido como “A Estrada da Morte”.

"Além da violência física direta, existem outras maneiras de se matar também. Cinco anos após a Estrada da Morte, a secretária de Estado, Madeline Albright, disse ao programa 60 Minutos da CBS, que a morte de 500 mil crianças, devido às sanções impostas pelos EUA ao Iraque, era um 'preço que valia a pena pagar' para a continuidade dos objetivos norte-americanos."

Mantendo a “máquina de matar rodando”
"Qualquer um que pense que a selvageria imperialista dos EUA entrou em algum tipo de misericordiosa pausa por conta da chegada de Barack Obama está vivendo em um mundo de fantasias. Obama pode ter tido a tarefa de acabar com as guerras que falharam no Iraque e no Afeganistão (o mesmo trabalho teria caído no colo de McCain, caso eleito), mas expandiu drasticamente a intensidade e o escopo da guerra com drones e a presença de tropas de forças especiais ao redor do mundo. Como o corajoso jornalista Allan Nairn destacou, Obama manteve a gigantesca e imperial 'máquina de matar rodando'."

Street enfatiza que o tom foi definido logo no começo, com Obama autorizando dois grandes ataques com drones no Paquistão em seu quarto dia como presidente. O primeiro ataque “matou de sete a quinze pessoas, todas elas praticamente civis”. O segundo “atingiu a ‘casa errada’ e matou de cinco a oito civis”, incluindo duas crianças. 

"Menos de seis meses depois, mais um dos 'ataques precisos com drones' atingiu um funeral e matou 'inúmeros civis – com idades de 18 a 55 anos'. Em outubro de 2009, Scahill reportou: 'Obama já autorizou, em 10 meses, a mesma quantidade de ataques com drones que Bush fez em seus oito anos de mandato'. Uma fonte militar contou a Scahill sobre uma operação de assassinato padrão das forças especiais na era Obama: 'Se existe uma pessoa que eles estão atrás, mas no mesmo local estão outras 34, então 35 pessoas irão morrer'."

“Os Estados Unidos são os do bem”

Street conta: "Na semana passada, uma radialista do Irã me perguntou se eu pensei que a pesquisa do WINMR-Gallup iria incitar qualquer repercussão anti-imperial por parte dos cidadãos norte-americanos, eu tive que dizer que não, por três razões. Primeiro, por ter sérias dúvidas que qualquer parte da mídia dominante nos EUA iria prestar atenção a uma pesquisa que tivesse tido como resultado algo que eles considerariam radicalmente inconsistente com a já habitual ideia que os EUA são uma força de paz e estabilidade no mundo."

"Segundo, porque pesquisas similares já haviam sido – fracamente – reportadas em outras ocasiões e pouco impacto tiveram na opinião pública e na orientação política nos EUA, que permanece indiferente às visões que outras pessoas têm sobre a parte ruim do poder dos EUA."

"Por último, porque mesmo se a pesquisa e o que as pessoas no exterior pensam tivessem mais espaço na mídia norte-americana, parece irreal pensar que mais do que uma pequena minoria de cidadãos estejam prontos para aceitar a noção de que os EUA são realmente uma ameaça para a paz mundial, muito menos a maior ameaça. Considerando as reflexões do antigo correspondente internacional do New York TimesStephen Kinzer sobre as ações dos EUA na anexação do Havaí e das Filipinas, seu domínio sobre Porto Rico e seus golpes de Estado na Nicarágua e Honduras nos finais dos séculos 19 e 20:


'Por que os norte-americanos apoiam políticas que trazem tanto sofrimento às pessoas em terras estrangeiras? Existem duas razões para tal que, de tão interligadas, se tornam uma. A razão essencial é que o controle dos EUA em lugares distantes veio a ser visto como essencial para a prosperidade material dos EUA. Essa explicação, entretanto, está amarrada dentro de outra: a crença mais profunda da maioria dos norte-americanos de que o país deles é uma força para o bem no mundo. 

Então, consequentemente, até mesmo a mais destrutiva das missões em que os EUA embarcam para impor sua autoridade é tolerável. Gerações de políticos norte-americanos e líderes empresariais reconheceram o poder da nobre ideia do excepcionalismo dos EUA. Quando eles intervêm no exterior por razões estúpidas e egoístas, eles sempre insistem que, no final, suas ações irão beneficiar não apenas os EUA, mas também os cidadãos do país ao qual estão invadindo e, assim, por extensão, as causas da paz e da justiça no mundo.'
 
Esse problema do “excepcionalismo dos EUA” – a crença doutrinal de que os objetivos e comportamento dos EUA são inerentemente benevolentes, bem-intencionados e um bem para o mundo – permanece profundamente enraizado mais de um século depois, relembra Street.

"E é a principal razão para que as pessoas no mundo inteiro estejam corretas em identificar os EUA como a maior ameaça à paz no mundo. Nada é mais perigoso – e maléfico – que uma única superpotência militar que enxerga a si mesma além de qualquer reprimenda moral."

Basta ler, a respeito disso, as seguintes declarações nacionalistas e narcisistas quanto à política externa norte-americana, tanto no Partido Democrata, quanto no Republicano, ressaltadas pelo autor: “Um mundo uma vez dividido entre dois campos armados agora reconhece uma única e dominante potência, os Estados Unidos da América, e eles reconhecem isso sem temor, pois o mundo confia a nós com poder e o mundo está certo. Eles confiam em nós para sermos justos e comedidos. Eles confiam em nós para estar do lado da decência. Eles confiam em nós para fazermos o que é o certo”. A frase é do presidente George H. W. Bush, de 1992.

“Quando eu fui eleito, eu estava determinado que nosso país entrasse no século 21 sendo ainda a maior força de paz e liberdade no mundo. Pela democracia, segurança e prosperidade”. Esta é do presidente Bill Clinton, de 1996.

“A América foi escolhida para o ataque porque somos o mais brilhante raio da liberdade e oportunidade no mundo… Hoje, nossa nação viu o mal… Nossa força militar é poderosa e está preparada, nós iremos em frente para defender a liberdade e tudo o que é bom e justo em nosso mundo”. Esta, do presidente George W. Bush, 11 de setembro de 2001.

“Nós lideramos o mundo combatendo males imediatos e promovendo o bem… A América é a última, a maior esperança da Terra… O maior propósito da América no mundo é promover e espalhar a liberdade. O momento americano não passou… Nós iremos aproveitar esse momento e renovar o mundo”. Do candidato à Presidência, Barack Obama, 23 de abril de 2007.

“Nossa segurança emana da justeza de nossa causa; a força de nosso exemplo; as qualidades moderadas de nossa humildade e comedimento”. Presidente Barack Obama, em 20 de janeiro de 2009.

“Os moralistas que pensam que não têm pecados”


Street ressalta que, lendo essas declarações e considerando o quão criminosa, racista e imperial é a realidade da política externa dos EUA nesse e em outros séculos, pode-se pensar no que o M. Scott Peck, psicoterapista e autor do estudo do mal no ser humano, disse:

“O mal no mundo é cometido pelos moralistas que acham que não possuem pecados, pois não estão dispostos a sofrer do desconforto da autocrítica. Seu pecado mais básico é o orgulho – pois todos os pecados são reparáveis exceto o pecado de acreditar que não possui pecado. Uma vez que eles têm que negar sua própria maldade, é necessário enxergá-la nos outros. Eles projetam sua própria maldade no mundo.”

Isso soa como uma reflexão sobre a retórica norte-americana quanto ao “excepcionalismo dos EUA”, diz o autor. Quando combinada com o histórico alcance do poder militar norte-americano, "o paralelo sugere que as pessoas no mundo estão perfeitamente certas em identificar a moralidade dos EUA como a maior ameaça à paz no planeta Terra".

O estudo de Peck, obviamente, era sobre indivíduos e não estruturas de poder, afirma Street. "Até onde se sabe, Barack Obama é um indivíduo perfeitamente moral e caridoso em relação à sua família e amigos (o mesmo vale para George W. Bush). Mas isso é irrelevante quando se fala de assuntos internacionais, onde o papel do presidente dos EUA e seus assessores de alto escalão é avançar no projeto imperial norte-americano – encharcado de sangue –, sob um pretexto de intenção benevolente e uma forma maligna e narcisista chamada de 'excepcionalismo norte-americano'."

Street ressalva, entretanto, que o mundo não é mais, claramente, enganado pela grande modificação de Obama quanto ao “Schwarzenegger da política internacional”. Ele entende, corretamente, que "o primeiro presidente pós-Bush, eleito com as palavras 'esperança' e 'mudança', não é nada mais do que um represente novo do império usando roupas velhas."

Com Znet, do artigo traduzido por Vinicius Gomes para a Revista Fórum