quarta-feira, 31 de julho de 2013

FIDEL :- VIVEU PARA LUTAR


Fidel Castro Ruz
Adital

Carta de Fidel Castro Ruz aos chefes e vice-chefes das delegações que visitaram Cuba por ocasião do 60º aniversário do assalto aos quartéis Moncada e Carlos M. de Céspedes.

Foto: Ismael Francisco
Tradução: ADITAL
Queridos amigos:
No dia 26 de julho comemora-se o 60º aniversário do assalto ao regimento do Moncada, em Santiago de Cuba e ao quartel Carlos Manuel de Céspedes, em Bayamo. Sei que inúmeras delegações pensam viajar a Cuba para partilhar conosco essa data na qual nosso pequeno e explorado país decidiu prosseguir a luta inconclusa pela independência da Pátria.
Na época, nosso movimento estava fortemente influído pelas novas ideias que se debatiam no mundo.
Nada se repete exatamente igual na história. Simón Bolívar, libertador da América, um dia, proclamou o desejo de criar na América a maior e mais justa nação, com capital no istmo de Panamá. Incansável criador e visionário, adiantou-se ao sentenciar que os Estados Unidos pareciam destinados a infestar a América de misérias em nome da liberdade.
Cuba sofreu, como também a América do Sul, a América Central e o México com o território que lhe foi arrebatado a sangue e fogo pelo insaciável e voraz vizinho do norte, que se apoderou de seu ouro, de seu petróleo, de seus bosques fabulosos de sequoia, de suas melhores terras e de suas mais ricas e abundantes águas pesqueiras.
No entanto, não estarei com vocês em Santiago de Cuba, pois devo respeitar a óbvia resistência dos guardiões da saúde. Mas, posso escrever e transmitir ideias e recordações que sempre serão úteis, pelo menos para quem escreve.
Há poucos dias, quando observava do carro o que fora um velho centro genético para a produção leiteira, pude ler uma brevíssima síntese de somente um parágrafo do discurso pronunciado no dia 1º de Maio de 2000, há mais de 13 anos.
O tempo apagará aquelas palavras em letra negra sobre uma parede branqueada com cal.
"Revolução […] é lutar com audácia, inteligência e realismo; é não mentir jamais, nem violar princípios éticos; é convicção profunda de que não existe força no mundo capaz de esmagar a força da verdade e das ideias. Revolução é unidade; é independência; é lutar por nossos sonhos de justiça para Cuba e para o mundo, que é a base de nosso patriotismo, de nosso socialismo e de nosso internacionalismo”.
Agora, se cumprem 60 anos daquele fato ocorrido em 1953, sem dúvida valoroso e demonstrativo da capacidade de nosso povo para criar e enfrentar a partir de zero qualquer tarefa. A experiência posterior nos ensinou que teria sido mais seguro começar a luta pelas montanhas, algo que planejávamos fazer caso fosse tomada a fortaleza do Moncada, não poderíamos a contraofensiva militar da tirania com as armas que ocupáramos em Santiago de Cuba, mais que suficientes para vencer naquela contenda e muito mais rapidamente que o tempo investido depois.
Os 160 homens escolhidos para a operação foram selecionados entre 1.200 com os quais contávamos, treinados entre os jovens das antigas províncias de Havana e do leste de Pinar del Río, filiados a um partido radical da nação cubana onde todavia o espírito pequeno burguês incutido pelos donos estrangeiros e por seus meios de divulgação, em maior ou menor medida, influíam em todos os lugares do país.
Eu havia tido o privilégio de estudar e, já na universidade, adquiri uma consciência política a partir de zero. Não é demais repetir o que já contei outras vezes, a primeira célula marxista do Movimento foi criada por mim com Abel Santamaría e Jesús Montané, utilizando uma biografia de Carlos Marx, escrita por Franz Mehring.
O Partido Comunista, integrado por pessoas sérias e consagradas de Cuba, suportava os avatares do Movimento Comunista Internacional. A Revolução, reiniciada em 26 de julho recolheu as experiências de nossa história, o espírito abnegado e combativo da classe operária, a inteligência e o espírito criativo de nossos escritores e artistas, bem como a capacidade que jazia na mente de nosso pessoal científico, que cresceu como espuma. Hoje, nada se parece ao de ontem. Nós mesmos, aos que o azar nos designou o papel de dirigentes, poderíamos nos envergonhar da ignorância que ainda mostram nosso conhecimentos. O dia em que não aprendamos algo novo será um dia perdido.
O ser humano é produto das leis rigorosas que regem a vida. Desde quando? Desde tempos infinitos. Até quando? Até tempos infinitos. As respostas também o são.
Por isso, mesmo que não as partilhe, respeito o direito dos seres humanos a buscar respostas divinas, perguntas que podem ser feitas, sempre e quando as mesmas não tendam a justificar o ódio e a não solidariedade no seio de nossa própria espécie, erro no qual muitas já caíram em um ou em outro momento de sua história.
Sem dúvida, aquela atrevida tentativa não foi um ato improvisado. No entanto, admito que a partir da experiência acumulada teria sido muito mais realista e mais seguro iniciar aquela luta pelas montanhas da Sierra Maestra. Com os 18 fuzis que conseguimos reunir depois do duríssimo revés que sofremos em Alegría de Pío, em parte pela inexperiência e pelo não cumprimento das instruções recebidas pelo Movimento em Cuba, e também pela excessiva confiança nossa no poder de fogo dos expedicionários armados com mais de 50 fuzis com mira telescópica, e seu treinamento em tiro. Mas, atentos aos voos rasantes dos aviões de combate do inimigo, descuidamos a vigilância em terra e nos atacaram em um pequeno bosque. Nunca mais o inimigo pode nos surpreender dessa forma.
Nos combates posteriores, sempre foi ao contrário; e nas ações finais, com menos de 300 combatentes, nos 70 dias de incessante luta, derrotamos a ofensiva de mais de 10 mil homens de suas forças de elite. Nos combates livrados durante dois anos sempre os bombardeiros e caças do inimigo costumavam estar em cima de nós em somente 20 minutos. No entanto, não consta que um só combatente tenha morrido por essa causa naquela dura batalha. Tudo mudou nas décadas seguintes, com a nova tecnologia desenvolvida pelos Estados Unidos e somadas às forças reacionárias na América Latina e no mundo, suas aliadas. Sempre os povos encontrarão formas adequadas de luta.
E vocês estarão lá, no cenário do primeiro combate.
Quando, depois dos fatos que se consumaram no dia 26 de julho, um último carro se aproxima e me recolhe, montei na parte traseira do veículo repleto de gente, outro combatente se acerca pela direita; desci e lhe dei lugar; o carro partiu e fiquei sozinho. Até o momento em que me recolheram pela primeira vez no meio da rua, com a escopeta semiautomática Browning e cartuchos calibre 12, tentava impedir que os homens usassem uma metralhadora calibre 50 do teto de um dos andares do edifício central de mando do amplo campo militar; era o único que se podia ver do tiroteio generalizado que se escutava.
Os poucos companheiros que, com Ramiro Valdés, haviam penetrado na primeira barraca, despertaram aos soldados que lá dormiam e, segundo me explicaram posteriormente, estavam em trajes menores.
Não pude falar com Abel e nem com outros de seu grupo que, de um alto edifício ao fundo do hospital civil, dominavam a parte traseira dos dormitórios. Eu considerava que era absolutamente óbvio para ele o que estava acontecendo. Talvez pensou que eu havia morrido.
Raúl, que estava com o grupo de Lester Rodríguez, via com clareza o que estava acontecendo e pensava que estávamos mortos. Quando o chefe dessa esquadra decide baixar, tomam o elevador e, ao chegar embaixo, toma o fuzil de um sargento, que não faz resistência, nem tampouco os soldados que iam com ele, Toma o mando do grupo e organiza a saída do edifício.
Nesse momento, minha preocupação fundamental era o grupo de companheiros que, supostamente, havia ocupado o quartel de Bayamo e não tinha nenhuma notícia de nós. Eu ainda contava com suficientes cartuchos e pensava vender minha vida bem cara, lutando contra os soldados da tirania.
De repente, aparece outro carro: vinha me buscar; e, de novo, albergo a esperança de ajudar aos companheiros de Bayamo, com uma ação no quartel do Caney.
Vários carros esperavam no final da avenida, onde eu pensava tomar a direção correta. Porém, o próprio companheiro que conduzia o veículo não a tomou; seguiu até a casa de onde partimos na madrugada; lá, trocou de roupa. Eu mudei de arma e tomei um rifle semiautomático calibre 22, com ponta de aço, com um pouco mais de alcance do que a de calibre 12; troquei de roupa e cruzamos uma cerca de arame farpado com aproximadamente 15 homens armados, um deles ferido. Outros deixaram suas armas e subiram aos veículos, tentando buscar uma saída. Comigo ia Jesús Montané e alguns outros chefes. Caminhamos durante horas naquela tarde quente pela encosta norte da Gran Piedra, uma elevada montanha que tentaríamos transpor, para dirigir-nos para o Realengo 18, um caminho empinado sobre o qual Pablo de la Torrente, excelente escritor revolucionário, escreveu que um homem com um fuzil podia resistir a um exército. Porém, Pablo morreu na Espanha, combatendo na Guerra Civil Espanhola, onde ao redor de mil cubanos apoiaram a esse povo contra o fascismo. O havia lido, mas nunca pude falar com ele, pois já havia viajado para a Espanha quando eu estava no colégio.
Nós não pudemos prosseguir até o Realengo e permanecíamos ao sul da cordilheira. A zona montanhosa preferida por mim para a luta guerrilheira se situava entre o santuário do Cobre e o central Pilón; planejei cruzar por ele até o outro lado da Bahia de Santiago de Cuba por um ponto que conhecia desde que estudei no Colégio de Dolores, na cidade onde vocês se reunirão. Grande parte de nosso pequeníssimo grupo estava esgotado pela fome e pelo cansaço. Um ferido havia sido evacuado e Jesús Montané, que apenas podia manter-se de pé. Outros dois, com menos responsabilidade, porém mais saudáveis, marchariam comigo para o ocidente daquelas montanhas. Porém, os fatos mais dramáticos e menos esperançosos estavam ainda por vir. À tarde, demos instruções aos demais companheiros para esconder suas débeis armas em algum lugar do bosque e dirigir-se naquela noite à casa confortável de um camponês que vivia às margens da estrada que ia de Santiago à praia, que dispunha de gado e tinha comunicação telefônica com a cidade. Sem dúvida, foram interceptadas pelo exército. O inimigo de todas as formas conhecia a área próxima onde nos movíamos. Antes do amanhecer, uma esquadra da chefatura militar fortemente armada nos despertou com a ponta de seus fuzis. As veias do pescoço e o rosto daqueles soldados bem alimentados latiam deformadas pela excitação. Nos considerávamos mortos e começa a discussão. No entanto, não me haviam identificado. Ao atar-me fortemente e perguntar-me o nome, ironicamente lhes dei um que usávamos em brincadeiras... Não podia compreender que não percebessem a verdade. Um deles, com o rosto decomposto, vociferava que eles eram os defensores da pátria. Com voz forte lhe respondo que eles eram os opressores, como os soldados espanhóis na luta de nosso povo pela independência.
O chefe da patrulha era um homem negro que, a duras penas podia manter o mando. Não disparem!, gritava constantemente aos soldados.
Em voz mais baixa repetia: "As ideias não me matam, as ideias não me matam”. Em uma daquelas ocasiões, se aproxima de mim e com voz baixa diz e repete: "Vocês são muito valentes, jovens”. Ao escutar aquelas palavras, lhe disse: "Tenente, eu sou Fidel Castro”; e ele responde: "Não diga isso a ninguém”. De novo o acaso se impõe com todas as suas forças.
O tenente não era oficial do regimento; tinha outra responsabilidade legal na região do Oriente.
Mais adiante, de novo, os fatos mais importantes se impõem.
Aos companheiros que deviam desmobilizar-se, dou instruções de guardar as armas e depois os custodiaríamos até o ponto onde deviam fazer contato com as pessoas do Bispo.
A opinião pública de Santiago de Cuba reagiu com energia frente aos horríveis crimes cometidos pelo exército batistano contra os revolucionários.
Monsenhor Pérez Serantes, Bispo de Santiago de Cuba, havia obtido algumas garantias favoráveis a suas gestões pelo respeito à vida dos revolucionários prisioneiros. A Sarría, no entanto, lhe restava uma batalha contra o mando do regimento que delegou a tarefa ao conotado sicário da carnificina imposta pelo chefe militar de Santiago de Cuba, que lhe ordenou trasladar os detidos ao Moncada.
Por primeira vez em nossa Pátria, os jovens haviam iniciado uma luta semelhante frente ao que fora o 1º de janeiro de 1959: uma colônia yanki.
Ao chegar á casa do vizinho junto à estreita estrada que une a cidade com a praia Siboney, um pequeno caminhão esperava. Sarría me sentou entre o chofer e ele. Centenas de metros mais adiante se topam com um veículo do comandante Chaumont, que demanda a entrega do prisioneiro. Como em um filem de ficção científica, o tenente discute e afirma que não entregará o prisioneiro, em vez disso o apresentará ao Vivac de Santiago de Cuba e não á sede do regimento. É dessa forma que o fato rememora uma inusual experiência.
É impossível em tão breve tempo expressar a nossos ilustres visitantes as ideias que suscitam em minha mente os incríveis tempos que estamos vivendo.
Não posso pensar que dentro de 10 anos, no 70º aniversário, escreveria um livro. Infelizmente, ninguém pode garantir que haverá um 70º, um 80º, um 90º, ou um centésimo aniversário do Moncada. Na Conferência Internacional sobre Meio Ambiente, do Rio de janeiro, disse que uma espécie estava em perigo de extinção: o homem. Porém, então acreditava que seria questão de séculos. Agora não sou tão otimista. De todas as formas, nada me preocupa; continuará existindo a vida na inabarcável dimensão do espaço e do tempo.
Enquanto isso, digo algo, já que cada dia amanhece para todos os habitantes de Cuba e do mundo:
Os líderes de qualquer das mais de 200 nações grandes e pequenas, revolucionárias ou não, necessitam continuar vivendo. Tão difícil é a tarefa de criar a justiça e o bem estar que os líderes de cada país necessitam autoridade, ou, do contrário, reinará o caos.
Em dias recentes, tentaram caluniar nossa Revolução, tentando apresentar ao Chefe de Estado e Governo de Cuba, enganando a Organização das Nações Unidas e outros chefes de Estado, imputando-lhe uma dupla conduta.
Não vacilo em assegurar que apesar de que durante anos nos negamos a assinar acordos sobre a proibição de tais armas, porque não estávamos de acordo em outorgar essas prerrogativas a nenhum Estado, nunca tentaríamos fabricar uma arma nuclear.
Estamos contra todas as armas nucleares. Nenhuma nação, grande ou pequena, deve possuir esse instrumento de extermínio capaz de pôr fim à existência humana no planeta. Qualquer um dos que já possuem tais armas já dispõe de número suficiente para criar a catástrofe. Jamais o temor de morrer impediu as guerras em nenhuma parte do planeta. Hoje, não só as armas nucleares, mas também a mudança climática é o perigo mais iminente que em menos de um século pode tornar impossível a sobrevivência da espécie humana.
Um líder latino-americano e mundial, ao que desejo render especial tributo pelo que fez a favor de nosso povo e de outros povos do Caribe e do mundo é Hugo Chávez Frías; ele estaria aqui entre nós, se não houvesse caído em seu valente combate pela vida; ele, como nós, não lutou para viver; mas, viveu para lutar.
Video: El Asalto al Cuartel Moncada en la Memoria de Fidel.